terça-feira, 16 de agosto de 2011

Sentimento do mundo, por Carlos Drummond de Andrade.

Tenho apenas duas mãos
e o sentimento do mundo,
mas estou cheio escravos,
minhas lembranças escorrem
e o corpo transige
na confluência do amor.

Quando me levantar, o céu
estará morto e saqueado,
eu mesmo estarei morto,
morto meu desejo, morto
o pântano sem acordes.

Os camaradas não disseram
que havia uma guerra
e era necessário
trazer fogo e alimento.
Sinto-me disperso,
anterior a fronteiras,
humildemente vos peço
que me perdoeis.

Quando os corpos passarem,
eu ficarei sozinho
desfiando a recordação
do sineiro, da viúva e do microcopista
que habitavam a barraca
e não foram encontrados
ao amanhecer

esse amanhecer
mais noite que a noite.

Um comentário:

  1. Tá muito lindo o teu espaço cheio de coisas boas para se ler, voltarei mais vezes, e fiquei feliz com a tua visita!!!
    tenha uma ótima semana!!!

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" Não importa o que aconteça, continue a nadar..." De volta após milhões de séculos, com as incertezas de outrora...